Cerca de um quarto dos produtos que a revista da DECO Dinheiro & Direitos analisou em 2010 anunciava taxas de juro acima das legais.
Empréstimo para comprar carro, electrodomésticos ou equipamento para energias solares, cartões, crédito pessoal sem finalidade específica, linhas de crédito fácil... A banca desdobra-se em modalidades de crédito ao consumo que satisfazem quase todas as necessidades de financiamento do consumidor, muitas vezes, a troco de juros altos.
Para combatê-los, o Banco de Portugal definiu uma TAEG máxima para cada tipo de crédito ao consumo, que as instituições são obrigados a respeitar. Na prática, nenhum empréstimo pode ser contratado acima daquele limite. Estas taxas mudam a cada três meses e são calculadas em função dos valores médios cobrados pelas instituições de crédito no trimestre anterior. A medida está em prática desde Janeiro de 2010, mas não impede os bancos de anunciar taxas acima do limite, como revela o levantamento dos 154 produtos de seis tipos de crédito que a Deco analisou durante o ano passado.
Cartões e pessoal com taxas altas
O Banco de Portugal definiu três categorias e oito subcategorias de créditos ao consumo, às quais correspondem limites diferentes. Talvez por serem pouco comuns e se destinarem a segmentos considerados prioritários, os créditos para educação, saúde e energias renováveis, e a locação financeira de equipamentos, como computadores e electrodomésticos, apresentam os limites mais baixos: TAEG máxima de 5,4% no último trimestre. Segue-se a locação financeira e o ALD de veículos novos e usados. Como o carro é propriedade da locadora até à última prestação, o que lhe dá algumas garantias, a taxa é mais baixa do que no crédito automóvel. O limite mais alto pertence aos créditos com mais procura e fáceis de usar: cartões, linhas de crédito e saldo descoberto das contas à ordem. Entre Outubro e Dezembro de 2010 podiam cobrar até 32,9%. Apesar de estas regras serem públicas e do conhecimento de todas as instituições, o levantamento da Dinheiro & Direitos a 154 produtos revela que um em cada quatro poderia resultar em taxas acima do limite. Ou seja, em teoria, poderiam ser contratados nessas condições. Os maiores desvios pertencem ao crédito pessoal sem finalidade específica, um dos mais contratados segundo o Banco de Portugal, e para energias renováveis. No primeiro caso, a TAEG máxima analisada (32,4%) quase duplica a permitida no período: 19,1 %. No segundo, a diferença é ainda superior: 13,6% contra 5,4%. A estrutura pesada das comissões, sobretudo para prazos curtos, o preço dos seguros e as taxas elevadas contribuem para este cenário.
10% dos contratos ilegais
As instituições defendem-se dizendo que não estão em infracção, pois as taxas são "teóricas" e nenhum crédito é aprovado naquelas condições. Mas ao apresentarem condições que resultam em taxas acima das legais, as instituições induzem o consumidor em erro. Todos os dados fornecidos devem ser reais. Caso contrário, não permitem a comparação de produtos.
Pior: o relatório de supervisão do Banco de Portugal, divulgado em Novembro último, prova que foram assinados vários contratos ilegais em 2010. Dos 676 analisados pelo supervisor, cerca de 10% ultrapassavam as taxas máximas permitidas, envolvendo 13 instituições. Segundo o documento, as entidades são obrigadas a corrigir as condições contratuais e têm de fazer prova desta correcção junto do supervisor. Mas não chega. O relatório nada diz, por exemplo, sobre a obrigação de devolverem aos titulares dos contratos ilegais os encargos cobrados em excesso.
Por isso, se contratou um crédito desta natureza no último ano, certifique-se de que a TAEG não ultrapassa a máxima para o trimestre. Se foi superior, queixe-se no portal do cliente bancário (http://clientebancario.bportugal.pt), exija a aplicação da taxa máxima para o período e a devolução do que pagou em excesso. Outro facto omitido é o nome das instituições em falta. Por uma questão de transparência, o Banco de Portugal deveria divulgar o nome dos infractores, como já fez no passado. Tal permite que outros consumidores fiquem alerta para eventuais abusos nas taxas e atuem, eles próprios, como polícias da aplicação da lei. O supervisor deveria ainda alargar a aplicação da lei às taxas anunciadas, seja na publicidade, seja nas simulações em papel ou pela net.
Simulações reais sem usura
A lei que limita as TAEG no crédito ao consumo estabeleceu um tecto para o preço dos financiamentos. Apesar disto, algumas modalidades abrangidas anunciam taxas, comissões e seguros obrigatórios que, para determinados cenários, resultam em taxas efectivas superiores ao limite. Pior do que isso, o relatório de supervisão do Banco de Portugal, divulgado em Novembro, revela 63 contratos efectivos com taxas acima das legais, envolvendo 13 instituições.
A Deco já enviou as conclusões deste estudo ao Banco de Portugal e à Secretaria de Estado para a Defesa do Consumidor, pedindo que a lei da usura seja aplicada também às taxas publicitadas nas simulações.
Crédito Automóvel
- 15.000 euros a 48 meses
- TAEG máxima permitida no período: 11,5%
- TAEG analisadas (1º trimestre de 2010): 4,5% a 16,8%
- Além do limite segundo cálculo da D&D: BBVA Automóvel, BBVA Quota Final, BPN Crédito, Banif Mais, Finibanco.
- Dos 17 produtos analisados, quatro excedem as taxas.
Saldo descoberto
- 1.500 euros a três meses
- TAEG máxima permitida no período: 32,6%
- TAEG analisadas (4.º trimestre 2010):10,3% a 36,2%
- Foram analisados 18 produtos, nenhum excedeu a taxa prevista.
Cartão de crédito
- 1.500 euros a 12 meses
- TAEG máxima permitida no período: 32,9
- TAEG analisadas (4º trimestre de 2010): 11,3% a 22,7%.
- Além do limite segundo o cálculo da D&D: UnibancoGold (Unicre)
- Foram analisados 70 produtos, apenas um excedeu a taxa máxima prevista.
Energias renováveis
- 5.000 euros a 24 meses
- TAEG máxima permitida no período: 5,4%
- TAEG analisadas (4.º trimestre 2010): 4,8% a 13,6%
- Além do limite segundo cálculo da D&D: Banco BPI, Banco Popular, Banif, Caixa Geral de Depósitos, Crédito Agrícola (taxa fixa e variável), Millennium bcp, Montepio, Santander Totta (crédito e ‘leasing').
- Foram analisados 11 produtos, 10 excedem as taxas máximas.
Crédito Pessoal S/ fim específico
- 5.000 euros a 24 meses
- TAEG máxima permitida no período: 19,1%
- TAEG analisadas (4.º trim. 2010): 7,7% a 32,4%
- Além do limite segundo cálculo da D&D: BBVA, Banco BPI (taxa fixa e variável), Banco Espírito Santo, Banco Popular, Barclays Bank, Caixa Galicia, Caixa Geral de Depósitos (taxa fixa e variável), Crédito Agrícola (taxa fixa e variável), Deutsche Bank, Finibanco, Millennium bcp
- Foram analisados 23 produtos, 14 excederam as taxas máximas.
Locação financeira (carro novo)
- 15.000 euros a 48 meses.
- TAEG máxima permitida no período: 8%
- TAEG analisadas (4º trimestre de 2010): 4,5% a 9,4%
- Além do limite segundo cálculo da D&D: ActivoBank/Millennium bcp, Banco Best, Banco Espírito Santo, Banif Mais, BPN Crédito, Deutsche Bank, Santander Totta.
- Foram analisados 15 produtos, nove excedem as taxas.
fonte:
economico.sapo