A actual conjuntura está espelhada no relatório de supervisão comportamental do Banco de Portugal.
A nova produção de crédito à habitação caiu a pique no ano passado, reflexo não só da maior selectividade na concessão, como da menor procura de financiamento. De acordo com o relatório de supervisão comportamental do Banco de Portugal, foram celebrados, entre 1 de Outubro de 2010 e 30 de Setembro de 2011, menos 42,1% do que no período homólogo do ano anterior. Dos cerca de 105,4 mil novos contratos celebrados, grosso modo, em 2010, houve uma descida para cerca de 61 mil novos empréstimos à habitação.
Estes dados agora divulgados pelo Banco de Portugal são um reflexo da actual conjuntura, em que os bancos têm dificuldades de liquidez, o mercado imobiliário vive um mau momento e, sobretudo, os particulares têm menores rendimentos ou, pelo menos, temem vir a ter, pensando muito mais antes de avançar para tamanho compromisso.
Os números do relatório revelam uma realidade que os balanços dos bancos não permitem descortinar, já que, em termos de ‘stock' total, as mudanças parecem discretas.
Ainda de acordo com os números de 2011 da supervisão comportamental, e em termos de saldo, o número de contratos de crédito à habitação variou apenas -0,2%. Como explica o Banco de Portugal no seu relatório, esta evolução resulta de vários factores conjugados, incluindo o efeito dos contratos de crédito à habitação que entretanto vão chegando ao seu termo. Da mesma forma, o valor em dívida estagnou, subindo apenas 0,1%, enquanto o montante inicial do crédito cresceu 1,8%.
Incumprimento motiva parte importante das renegociações
O Banco de Portugal traça igualmente o retrato dos problemas de crédito malparado no País. Do total de contratos renegociados entre Outubro de 2010 e Setembro de 2011, 17% "estavam numa situação de incumprimento e cerca de 4%, apesar de não estarem em incumprimento, os seus titulares apresentavam incumprimentos noutros créditos obtidos na mesma instituição".
Na maioria das renegociações, as mudanças passam pelo aumento do prazo do empréstimo e do ‘spread'. As duas alterações surgem normalmente em conjunto. Embora não seja taxativo, a instituição liderada por Carlos Costa diz que "as renegociações que envolvem a extensão do prazo podem estar associadas a tentativas de redução das prestações mensais em situações de dificuldades financeiras por parte das famílias".
Outro dado curioso, reflexo porventura do actual contexto, é a queda de 18% dos reembolsos antecipados totais dos créditos à habitação. "O reembolso antecipado total está muitas vezes associado à transferência do crédito à habitação para outra instituição ou à troca de habitação", diz o relatório. Ora, a realidade é que o volume de compra de casas caiu. Da mesma forma, nenhum banco faz hoje um novo contrato de habitação aos baixos ‘spreads' de antigamente. Raras serão, por isso, as famílias que neste momento quererão fazê-lo.
Outras conclusões do relatório
1 - Aumento do número de depósitos
Em 2011 os bancos portugueses registaram um aumento de 18% no número de novos depósitos. O aumento foi vivenciado em todos os prazos, excepto nos depósitos a cinco anos. Os depósitos a prazo simples apresentam sobretudo maturidades até um ano - sendo o prazo de 6 meses aquele que reúne maior número de produtos - mais de um quarto do total.
2 - Bancos cumpridores nas campanhas
O BdP exigiu a modificação de 128 campanhas e a suspensão de outras três, por incumprimento de normas legais ou regulamentares aplicáveis. No entanto, o rácio entre o número de campanhas alteradas e o número de campanhas analisadas fixou-se, em 2011, em cerca de 3%,
descendo face ao 6% de em 2010, a sinalizar que as instituições estão mais cumpridoras.
3 - Depósitos indexados e duais caem 62%
O número de depósitos indexados e duais comercializados caiu, no ano passado, 62%, sendo que o montante depositado neste tipo de produto financeiro recuou 54% em termos homólogos. No ano passado foram comercializados 35 depósitos deste género, num montante total de 351,4 milhões de euros.
4 - ‘Spread' dispara no crédito à habitação
Em apenas quatro anos os clientes bancários viram o ‘spread' dos crédito à habitação disparar de 59 p.b., em Novembro de 2007, para 249 p.b. nos contratos celebrados em Setembro do ano passado. O aumento mais pronunciado dos ‘spreads' aconteceu numa altura em que as Euribor assumiram valores baixos face ao histórico.